MUSA from _MNSTR_ by Jonas Sá

MUSA (Jonas Sá)


Adepta à andar pela sombra
Vivia cerrada
Usava vestidos de pano de farda
E não se deixava tocar

Na rua, lhe ofereciam olhares, flores, cigarros
Paravam os carros, abriam as portas,
Pediam sorrisos
Mas ninguém a podia enxergar

Oprimida por olhos famintos
de desconhecidos
Seu passo apertava por medo dos silvos
Conversa fiada no ponto, “que horas são?”

Mas sozinha cantava
A canção
Que exumava sua carne
E sua emoção

Invadida, embora envaidecida,
Ela mirava o espaço,
E a falta de espaço de toda sua vida
Queria ser mulher de homem algum

E eu, em vão, oferecia “bom dias”
E a minha companhia,
Meus dedos, meus dentes, meu espirito santo
O silêncio pacato enquanto queimava em minha paixão

Era um homem comum, num mundo de machos homens
Mas mal me encaixava, por mais que eu tentasse
Um perna de pau,
sabia brigar mas chorava depois

Me sentia invisível mas
Ela viu
Me abraçou em uma tarde
E me abriu

Eu via seus lábios morenos
ensaiando palavras
Que eu desconhecia, que eram sonhadas
Do leito de um rio onde deitava seus pés

Sua pele da cor de uma árvore
velha e frondosa
Seu peito descia e subia como a lua
seu rosto franzia no meu

Descoberta da roupa e da culpa
e da objetificação
Enfim se viu livre e apertou o meu corpo
Com os olhos molhados, perdidos então

(ela disse:)

“Eu me chamo maria mas
Sou Joõo
O meu corpo sabia
Mas eu não”

Perplexo, cabelos molhados
colados nos ombros
A epifania brilhava em seu rosto
Seu peito apontava pro meu coração

Sem ação, sem a frase de efeito
perfeita, nossa mancha me olhando
de onde ele se deita
me rendi à alegria de vê-lo se encontrar

(e eu disse:)

“Não pertenço ao mundo dos homens
Como sou do teu corpo, da tua presença
Não importa o que sejas: um homem recente
Ou mesmo aquela mulher.”

Esse homem te ama,
João
E o amor é supremo
u-huuuu

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